Grama do chocolate do ovo de Páscoa custa até 532% mais que o de
uma barra comum da mesma marca.
Essa conta simplificada pega o peso
líquido do ovo e da barra e calcula um valor por 100 gramas do chocolate;
não destrincha, claro, o valor de embalagens incrementadas e de brindes
infantis. Mesmo assim: será que há justificativa para o preço final dos ovos
chegar a seis vezes o valor de barras e bombons? Na média, a diferença de preço
dos 64 ovos pesquisados em relação ao chocolate tradicional, em quatro
supermercados do Rio, é menos dramática, mas ainda alarmante: pelo valor de um
ovo, compram-se três tabletes (ou o equivalente em bombons).Os produtos mais
caros são aqueles que vêm com formatos “diferenciados”, como o Diamante Negro
em forma de diamante, da Lacta, e o Alpino, da Nestlé, que imita um bombom
gigante — respectivamente, seis e cinco vezes o preço das barras de chocolate
de suas marcas no site Americanas.com. Também vão pagar mais os consumidores
que optarem por ovos infantis, que vêm com um brinquedinho. Se o brinde for um
bichinho de pelúcia, então... Prepare-se para desembolsar um bom dinheiro. Um
ovo da Lacta com um brinquedo de plástico custa, também na Americanas.com,
cinco vezes a barra. Já com um bicho de pelúcia, sai por seis vezes o preço.—
Às vezes, é interessante fazer uma negociação com a criança e comprar um
brinquedo — sugere Karina Alfano, gerente do relacionamento do Instituto
Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). — E é importante ver se o brinde é
realmente o que você quer. Às vezes o desenho na embalagem pode levar ao
erro.Carolina Kechinsky, dona de uma rede de lojas franqueadas da Cacau Show em Porto Alegre ,
justifica: as empresas precisam pagar alto para poder usar marcas de
personagens nos brinquedos, os licenciamentos.
O fato é que, com o apelo da Páscoa, os consumidores se dispõem a pagar mais.
Mesmo os ovos que apenas reproduzem chocolates mais simples, como o chocolate
branco ou a versão ao leite da Nestlé, são muito mais caros que a barra — quase
quatro vezes o preço, no supermercado Mundial da Lapa. Segundo Maribel Suarez,
professora da Coppead/UFRJ especializada em comportamento do consumidor, na
hora da compra, conta mais o símbolo embrulhado no papel de presente do que o
chocolate:— A gente não compra produtos apenas por seus aspecto funcional.
Estamos dispostos a pagar mais ou menos pela carga simbólica. Isso está
presente na lógica do consumo como um todo. Na indústria de beleza, as embalagens
de produtos infantis foram transformadas em brinquedos. Um
xampu pode ser um peixinho, um carro.Afora as emoções consumistas de cada um,
existem fatores mais concretos que tornam os preços dos ovos de Páscoa mais
altos. O presidente-executivo da Associação de Supermercados do Estado do Rio
(Asserj), Aylton Fornari, diz que a responsabilidade pela diferença dos preços
não é dos estabelecimentos. As empresas fabricantes admitem que a estratégia é
delas e repetem um mantra: embora a matéria-prima seja a mesma, barras e ovos
são produtos diferentes. Segundo a Nestlé (também dona da Garoto) e a Lacta, o
processo de produção não só exige mais funcionários, como mais cuidado para
embalar e transportar. Arcor e Ferrero não responderam às perguntas. A Lacta
informou que contratou mil funcionários para trabalhar nas fábricas e outros
oito mil para reforçar o atendimento nos pontos de venda — mas também vai
vender mais. Além disso, segundo a empresa, há uma equipe para desenvolver os
produtos da Páscoa, que começa a trabalhar 18 meses antes do feriado.As
empresas em geral começam a produzir meses antes da Páscoa. Segundo a
professora da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp Priscilla Efraim,
a produção dos ovos começa em agosto, ou mesmo antes. A armazenagem aumenta os
custos das empresas. Depois disso, os fabricantes precisam gastar mais com
transporte, já que os ovos são mais delicados que as barras de chocolate.
Priscilla não esclareceu o quanto esse processo pode encarecer o produto, mas
acredita que cobrar cinco vezes mais por um ovo “é um pouco demais”:— É a lei
do mercado. Se a procura é alta, independentemente do custo de produção, em uma
economia capitalista, o preço aumenta.Professor da Faculdade de Engenharia de
Alimentos da Universidade Federal da
Grande Dourados, em Mato Grosso do Sul,
Gerson Ribeiro Homem, especializado em logística, acredita que, para uma
indústria automatizada, os percalços extras enfrentados na fabricação dos ovos
de Páscoa justificam em parte o aumento do preço, mas existe um limite:— Para
uma indústria automatizada, eu esperaria entre duas vezes e meia e três vezes
meia o preço (da barra), com os argumentos apresentados.A professora Roberta
Thys, da Faculdade de Engenharia de Alimentos da UFRGS, no Rio Grande do Sul, concorda
que os preços na Páscoa são mais altos por causa da demanda. Já a empresária
Carolina Kechinsky acredita que um preço até duas vezes mais alto é
compreensível. Mais que isso pode ser “complicado”:— Para ser mais que isso, o
custo de desenvolvimento deve ter sido muito alto, com equipamentos especiais e
equipe de desenvolvedores.Há um ponto fora da curva. Os produtos da Ferrero —
ovos de Ferrero Rocher e Kinder Ovo — não são mais caros do que seus chocolates
comuns, apesar de terem preços às vezes mais altos do que os produtos de
Nestlé, Arcor e Lacta. O grama de produtos importados vendidos no supermercado
Zona Sul, como o ovo de Páscoa do chocolate italiano Baci, também custa o mesmo
ou menos que o de seus originais. A Ferrero não informou o motivo dessa
diferença. Para Priscilla, como esses chocolates já são mais sofisticados e
exigem outro tipo de linha de produção, o ovo não deve ser tão mais custoso
para a fabricante.Lá fora, aliás, a história é um pouco diferente.
Na
Inglaterra, os ovos também são mais caros que os chocolates comuns, mas os
preços são bem mais convidativos. Um ovo do Kit Kat, de 100 gramas , pode ser
adquirido pelo equivalente a R$ 4,47, enquanto aqui custaria R$ 14,70 (o valor
é proporcional, já que o único ovo da marca disponível tem 340 gramas ). Fora
questões burocráticas, como impostos, por mais que o mercado brasileiro tenha
se desenvolvido nos últimos anos, o fato de ainda não sermos grandes
consumidores per capita de chocolate pode afetar o mercado.Segundo a Associação
Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados
(Abicab), o Brasil é um dos maiores mercados, mas, atualmente, o consumo per
capita ainda é de 2,2 quilos por ano. Há três anos, era de 1,65 quilo — um
aumento de 33%. Um relatório da instituição World Cocoa Foundation mostra que,
em 2009 (pós-crise), o consumo de chocolate per capita na Europa era de 6
quilos — sendo que, na Romênia, o país que mais consome o produto, o número
pula para 15 quilos.Mobilizações e explicações à parte, de acordo com a
Associação Brasileira de Supermercados (Abras), os ovos de Páscoa estão 7,6%
mais caros este ano em relação a 2012. Mas o preço salgado não inibe o otimismo
do varejo.
A instituição prevê aumento de 7% nas vendas de chocolate para a
Páscoa de 2013. Ursulino Neto, da Abicab, não informou o quanto o feriado
contribui para o faturamento anual da indústria do chocolate. Limitou-se a
dizer que a Páscoa é o “13o mês” dessa indústria.
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